Vigora no ordenamento jurídico, a Lei 8.009/1990, que dispõe sobre a impenhorabilidade do imóvel próprio do casal ou da entidade familiar, que tem por finalidade proteger a habitação da família, proteção esta que decorre da própria Constituição Federal de 1988, elevada à condição de base da sociedade e merecedora de proteção especial do próprio Estado.
A impossibilidade de penhora do único imóvel do casal ou da entidade familiar, denominado bem de família, alcança tanto as dívidas de natureza civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou aquelas de outra natureza, com ressalva daquelas dívidas que tem por origem o próprio financiamento para aquisição do imóvel ou para reforma, decorrente de dívida de pensão alimentícia, impostos e execução de hipoteca.
Vale ressaltar que, a penhora permitida pela Lei 8.009/1990, em seu artigo 3°, inciso V, se refere aquele bem dado em garantia hipotecária por dívida contraída pelo próprio casal ou entidade familiar, de maneira que, a proteção legal não alcança a condição de uma garantia irrenunciável.
Assim, penhora do bem da família pode ser permitida quando a hipoteca se der sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar, porém essa exceção se restringe a situações em que a garantia foi ofertada para constituição de dívida que se reverte em proveito da própria entidade familiar, conforme entendimento formado pelo Superior Tribunal de Justiça.
Entretanto, em se tratando de bem dado como garantia hipotecária para garantir dívida de terceiro, tal situação não retira a proteção legal de impenhorabilidade, ainda que a oferta tenha sido expressa pelo garantidor.
Não é incomum situações em que algumas pessoas, a pedido de amigos ou familiares, que pretendem fechar contrato de empréstimos, se deparem com o pedido de serem garantidores do negócio. Assim, muitas vezes pautados na confiança e amizade, dão em garantia seu único imóvel, utilizado, na maioria das vezes, para moradia, como forma de garantir contrato firmado por terceiros (amigos ou familiares). Entretanto, em caso de eventual inadimplência pelo contratante, o imóvel dado como garantia da dívida, pode causar ao proprietário e garantidor do negócio, graves problemas judiciais.
Assim, a consequência do não pagamento não é outra senão, a cobrança judicial pelo Banco da dívida não paga pelo terceiro, resultando na penhora do imóvel dado em garantia pelo terceiro, causando desespero e angustia pelo medo de perder o seu único bem, e, muitas vezes, é o que acontece, o imóvel é penhorado e arrematado para pagamento de dívida de outra pessoa.
O que muitos não sabem é que, muito embora tenha oferecido o seu único imóvel, ou seja, aquele do qual reside, para garantir o pagamento de uma dívida por terceiro, tal situação não retira sua condição de impenhorabilidade, visto que se trata de condição irrenunciável, com objetivo proteger a dignidade da pessoa humana.
A irrenunciabilidade dessa condição de bem família por meio de garantia hipotecaria, visa a proteger o local em que estabelecida a residência da pessoa, lugar onde se abriga das tempestades, onde cria e mantém seus laços afetivos e onde se descansa. É um lugar fundamental para o desenvolvimento da pessoa, o que é reconhecido pela Constituição Federal.
No mesmo sentido, os Tribunais de Justiça, em especial o Superior Tribunal de Justiça, vem reiteradamente reafirmando o entendimento de que, a condição de impenhorabilidade do imóvel que constitui residência do casal ou da entidade familiar, é uma garantia irrenunciável, de maneira que, ainda que oferecido por vontade própria em garantia hipotecária para satisfação de dívida ou obrigação de terceiro, não retira sua condição de bem impenhorável.
Assim, a proteção sobre bem imóvel que constitui residência do casal ou da entidade familiar, que foi dado em garantia em favor de dívida de terceiro, desde que não tenha beneficiado os garantidores, é impenhorável, tendo em vista se tratar de proteção que não admite renúncia.
Dra. Elisângela Borges da Silva
OAB-PR n° 62.049